Richard Simonetti

[email protected]

Sabe que todas as vicissitudes da vida, todas as dores, todas as decepções são provas ou expiações e as aceita sem murmurar.

O Homem de Bem, em O Evangelho segundo o Espiritismo.

            Há um princípio básico em todas as religiões: Deus, o Criador, é a justiça perfeita. Governa o Universo com absoluta equidade.

            Considerando assim, forçoso admitir que as adversidades estão relacionadas com o comportamento do homem. Algo fizemos ou estamos fazendo, a determinar que as enfrentemos. A alternativa seria Deus impor-nos algo que não merecemos, inconcebível injustiça.

            Se não encontram justificativa na vida presente, não seria razoável cogitar a possibilidade de remontarem ao passado remoto, antes de aportarmos neste vale de lágrimas? Aqui caímos na reencarnação, milenar princípio que está presente em todas as culturas e em todas as épocas, deturpado, não raro, pela fantasia.

            Na Índia, eminentemente reencarnacionista, há a equivocada ideia da metempsicose, segundo a qual o Espírito pode retornar à carne em condição sub-humana.

            Diz o guru:

            – Não mate aquela mosca. Pode ser sua avó reencarnada!

            Diz o sociólogo:

            – Reduzamos o crescimento da população plantando árvores. Quando mais almas a envegetar, menos almas a reencarnar.

            Diz o religioso:

            – Não cultive a maledicência. Você poderá retornar como uma jararaca.

            Sugestivas fantasias, distanciadas da realidade. O Espiritismo nos oferece uma visão mais objetiva e real da reencarnação, situando-a como uma lei divina que atende à característica fundamental do ser humano – a perfectibilidade.     Somos, antes que homens, Espíritos imortais, destinados à perfeição. Seremos um dia copartícipes na obra da criação, chegaremos onde Jesus está, tanto quanto ele esteve um dia onde estamos.

             A reencarnação agiliza esse processo, no suceder de múltiplas existências na Terra, uma escola compatível com nosso estágio evolutivo.

            E atente ao detalhe, caro leitor: Ninguém retrograda a estágios inferiores, no reino vegetal e animal. De lá viemos, mas para lá não tornaremos, ainda que muita gente bem o mereça. A evolução é uma estrada de mão única.

             A dor, a dificuldade, o sofrimento, a morte, fazem parte de nosso aprendizado e atuam como lixas grossas que desbastam nossas imperfeições mais grosseiras, preparando-nos para luminoso porvir.

            Por que existem esses problemas na Terra?

            Porque aqui é uma escola primária, frequentada por Espíritos que mal saíram da animalidade e ainda são orientados pelo egocentrismo dos seres inferiores, a tendência de pensar muito em si mesmos e o resto que se dane. Daí a confusão no Mundo.

            À medida que erramos e colhemos as consequências, na forma de dores e atribulações, vamos compreendendo o que devemos e o que não devemos fazer, acertando o rumo.

            Nesse contexto situam-se as provações e as expiações.

            Provação é a situação difícil que o Espírito planeja ao reencarnar, consciente de que tem débitos a resgatar, que é preciso passar por um processo de depuração, a fim de que se reintegre nos ritmos da vida dos quais se afastou pela inconsequência, o erro, o vício... Estabelecendo uma comparação, digamos que o Espírito em provação é o cidadão que, tendo cometido crimes, apresenta-se voluntariamente à polícia, disposto a assumir a consequência deles. Na prisão, geralmente tem bom comportamento, enfrentando com serenidade a privação da liberdade. Tem consciência de que está ali para pagar seu débito com a sociedade.

            Os casos de superação, em que o indivíduo dá volta por cima, como se costuma dizer, geralmente envolvem Espíritos em provação. Nicholas James Vujicic nasceu em Melbourne, Austrália, em 4 de dezembro de 1982, com uma grave deficiência dificiência   física, devido à rara síndrome de Tetra-amelia: sem os dois braços e sem pernas, apenas com dois pés pequenos, um deles com dois dedos.

Imagine, leitor amigo, o problema de um ser humano com tais limitações! Vujicic cresceu deprimido, sentindo-se injustiçado por Deus. Na adolescência chegou a cogitar do suicídio. Sua atitude mudou quando tomou conhecimento de outras pessoas com graves deficiências físicas, que literalmente davam a volta por cima.

Ligado a uma igreja evangélica, aos dezessete anos fundou uma organização sem fins lucrativos, Life Without Limbs, Vida sem Membros. Cursou faculdade e aos vinte e um anos diplomou-se em Contabilidade e Planejamento familiar. Desde então Vujicic faz palestras motivacionais em vários países, impressionando multidões que contemplam aquele homem sem braços e sem pernas, que se equilibra sobre precários pés, a exaltar a Vida e a confiança em Deus.

Pessoas assim valorizam a existência, resgatam débitos cármicos, habilitam-se a estágios mais altos de espiritualidade.

 Sobretudo nos deixam envergonhados, porquanto, com problemas muito menos complexos, deixamo-nos abater, não raro com pena de nós mesmos.

            Na expiação, temos essas mesmas situações difíceis, dores e sofrimentos, que surgem não por escolha do Espírito, mas por imposição da Lei Divina.

            Vêm na marra, como se costuma dizer. Seria o criminoso caçado pela polícia, que quer fugir de suas responsabilidades, mas acaba preso, julgado e condenado. Geralmente, Espíritos em expiação são rebeldes, têm dificuldade para aceitar seus infortúnios, sentem-se injustiçados, debatem-se e, não raro, comprometem-se em novos desatinos.

            A revolta, o rebelar-se contra as situações expiatórias, é extremamente perigosa. Leva o condenado a comprometer-se em novos desvios.

            É o Espírito que na vida passada foi rico, malbaratou as oportunidades, comprometeu-se em desatinos. Reencarna em situação de penúria mas, ao invés de enfrentar suas dificuldades com coragem e determinação, apela para a desonestidade, busca a riqueza partindo para o crime, a violência, o tráfico de drogas.

            Há o portador de grave enfermidade que tem por objetivo conter suas tendências, mas reage negativamente, é rebelde e agressivo, complica a vida da família com suas crises neuróticas.

            Pior acontece com aquele que, rejeitando as experiências educativas a que é submetido, assume a postura de fuga, partindo para o suicídio, essa porta falsa que longe de livrá-lo de seus padecimentos, apenas o mergulha em dores mil vezes acentuadas, impondo-lhe novas e difíceis expiações.

            A população terrestre não é composta por santos ou missionários. Estes constituem exceção.

            Podemos, até para uma tomada de posição, avaliar nossa condição. Estamos aqui em provação ou expiação?

Preparei pequeno teste a respeito, caro leitor.

            Diante das situações abaixo, faça sua opção.

01 –     Morte do ente querido.

            Provação: Seja feita a vontade de Deus.

            Expiação: Por que Deus fez isso comigo?

02 –     Doença grave.

            Provação: Deus me dará forças!

            Expiação: Não suporto esse sofrimento!

03 –     Iminência da morte:

            Provação: Entrego-me aos bons Espíritos.

            Expiação: Resistirei até o último suspiro!

04 –     Dificuldades de uma prova escolar.

            Provação: Estudarei mais.

            Expiação: Prepararei uma cola.

05 –     Desastre financeiro.

            Provação: Começarei vida nova.

            Expiação: Minha vida acabou.

06 –     Amor não correspondido:

            Provação: Respeito seus sentimentos.

            Expiação: Contratarei um despacho de amarração.

07 –     Desilusão amorosa.

            Provação: Deus é pai. Aprenderei a viver sem ele.

            Expiação: Deus é pai. Ele há de pagar!

08 –     Desavença num relacionamento.

            Provação: Peço desculpas.

            Expiação: A culpa é sua.

09 –     Prejuízos causados a alguém.

            Provação: Assumo minha responsabilidade.

            Expiação. Negarei até o fim.

10 –     Familiar difícil.

            Provação: Estamos juntos para nos harmonizarmos.

            Expiação: Será que andei atirando pedras na Cruz?

11 –     Motorista imprudente.

            Provação: Deus o ilumine.

            Expiação: O diabo o carregue.

12 – Sacola de dinheiro encontrada.

            Provação: Procurarei o dono.

            Expiação: Gastarei até o último centavo.

            Se na maior parte das respostas você optou pela primeira alternativa, parabéns! Significa que tem maturidade para enfrentar o resgate de seus débitos, como o aluno que se submete à avaliação de aproveitamento, habilitando-se à promoção para nível superior.

            Se ficou na segunda, será interessante repensar sua maneira de ver o Mundo, cultivando reflexão, a fim de não perder as oportunidades de edificação da jornada humana, complicando o futuro.

.           O Código Penal Brasileiro determina que o condenado tenha uma redução da pena, desde que se disponha a estudar e trabalhar na prisão.

            Imita o código divino, a preceituar que, independente do fato de estarmos em provação ou expiação, podemos amenizar nosso resgate observando essas mesmas disciplinas.

            Com o estudo da Doutrina Espírita temos uma visão mais objetiva dos problemas existenciais e nos habilitamos a enfrentá-los com serenidade, evitando os males maiores originários da rebeldia.

            Com o trabalho do Bem conquistamos valiosos créditos na contabilidade divina, reduzindo nossos débitos. Aprendemos com o Espiritismo que quanto mais nos dedicarmos a estancar lágrimas alheias menos lágrimas verteremos.

            É o que nos diz Auta de Souza, a grande poetisa do Nordeste, em psicografia de Francisco Cândido Xavier:

Benditas sejam, torturando embora,

As lágrimas que a vida transfigura

Na fonte generosa, viva e pura

De perfeição e luz para quem chora.

Lírios e estrelas de celeste alvura,

Entre as sombras da mágoa que aprimora,

Rolam do coração, lembrando a aurora

No imenso caos da imensa noite escura!...

Benditas sejam! Lágrimas divinas

Como flores brilhando sobre as ruínas,

Que a provação estende, véspera e franca...

Mas, acima da bênção que as alveja,

Ante a glória do amor, bendita seja

A mão da caridade que as estanca!

Nota: Este artigo é um excerto do livro O Homem de Bem, de Richard Simonetti, baseado no capítulo XVII, de O Evangelho segundo o Espiritismo, em que Allan Kardec comenta os valores que identificam o verdadeiro homem de Bem.

 Livrarias e Clubes do Livro Espírita que participam das homenagens aos 150 anos de publicação daquela obra básica da Doutrina Espírita, podem fazer seu pedido para o seguinte endereço: CEAC-Editora, Rua Quinze de Novembro, 8-55, telefone 14 3227-0618 – Bauru SP (CP 17015-04). E-mail: [email protected]                   ­­­­

De todas as coisas na vida, nada há mais preciso do que a morte.

Qualquer criatura que goze de vida, tem assinalada, em algum momento, a sua morte.

Imparcial como ninguém, ela arrebata jovens e idosos, desiludidos, sonhadores e idealistas, trabalhadores e ociosos.

Inoportuna, surge em momentos de mágica alegria, transformando o ambiente com seus véus de crepe negro.

Incoerente, leva os mais jovens e saudáveis, deixando no seu rastro pessoas enfermas e de anos incontáveis.

Entretanto, o mais terrível não é a sua ação direta, mas suas consequências, ou seja, o grande vazio que deixa nas vidas dos que prosseguem na Terra.

A incerteza de que haja um depois da morte leva muitas pessoas ao desespero, ao abandono de si mesmas, à depressão.

Walter Lowen foi uma dessas pessoas. Depois de um convívio de trinta e sete anos, foi separado de sua amada Selma, de forma inesperada, pelo espectro da morte.

Ele não sabia como continuar vivendo sem a presença dela. Ela era o seu sol, em torno do qual ele, um pequeno planeta, realizava sua órbita, dia após dia. Ele se sentia como alguém sozinho na escuridão.

O médico, percebendo seu estado emocional desesperador, o fez retornar do mundo de sombras em que se encontrava, dizendo-lhe: Você tornará a vê-la.

Depois de escutar a curta frase, Walter começou a pensar que a separação da esposa era algo temporário.

E tudo ficou mais fácil de ser suportado. No entanto, foi quando lhe chegou uma carta, que ele se sentiu profundamente tocado.

Dizia assim: Eu não conheço a forma da imortalidade. Mas, também, nunca vi o amor, a fé, a integridade ou qualquer das outras qualidades que dão sentido e beleza à vida.

Apesar disso, não ponho em dúvida sua realidade, pois já vivi com elas em ação. A morte não destrói essas qualidades.

Só se pode perder o amor quando é retirado de nós. A morte não o tira, pois o amor não tem limites.

O amor continua conosco, cercando-nos e fortalecendo-nos, uma força ativa e positiva, uma realidade mais profunda do que o som de uma voz ou o toque de uma mão, por mais queridas que sejam essas sensações.

Como é possível, então, descrer da imortalidade da alma?

Sua esposa vive e continua a amá-lo, esperando um dia reencontrá-lo para a continuação dessa convivência que vocês souberam valorizar durante trinta e sete anos, ininterruptamente.

Nesse dia, Walter retornou à vida...

*  *   *

A certeza da Imortalidade é das mais gratificantes revelações. Confere a certeza do reencontro. Permite que aquele que permanece jornadeando pelos caminhos do mundo, tenha robustecida a chama da esperança.

Esperança de que o amor continua, que o amor ama e vela.

Certeza de que não caminha só, no mundo. Que, mesmo que reconstrua a sua vida afetiva, ao lado de outro cônjuge, o amor amado entende e abençoa.

E, afinal, depois de passados os anos, transcorrido o tempo, chegado o momento da sua própria partida, será recebido, no mais Além, por quem lá vive e ficou anos aguardando.

Ao chegar, será recepcionado com um sorriso, um grande abraço e as doces palavras: Que saudade! Há quanto tempo espero você.

Morte, prelúdio da verdadeira vida! Pensemos nisso.

Redação do Momento Espírita, com base no artigo
Morte, prelúdio da vida, de José Ferraz, da Revista
Internacional de Espiritismo, de fevereiro de 2014.
Em 25.3.2014.